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Amor às Kuartas

Aqui fala-se de amor às quartas-feiras

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Amor às Kuartas

12
Jul17

Reticências

Kalila

 

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Da janela do café Maria vê as traseiras da sua empresa. Vê estacionar o Sr. Gonçalves, o chefe do armazém. Pela porta do pendura sai a eterna companhia de almoço do Sr. Gonçalves, a linda Sofia, uma mestiça de olhos verdes que cuida da limpeza das instalações.

O que levará um senhor casado de meia idade a manter uma relação daquele tipo quando hoje em dia é tão mais natural separar-se quando não se é feliz?

O Sr. Gonçalves lá saberá as próprias razões! Ou não...!

Na mesa do lado uma complicada conversa de circunstância acerca de mudanças climáticas denota algum nervosismo do interveniente mais tímido. O outro, também masculino, é conhecido pela sua orientação homossexual. Maria conhece-o do elevador, são vizinhos de edifício, é um homem lindo e vistoso, extremamente simpático e delicado.

Demasiado perfeito, pensará quem o julgue apenas como homem. Uma pena que seja gay, para as que babam por ele...!

Atrás do balcão do café cozinham-se pratos simples: omeletes com diversos acompanhamentos, bifes no prato e no pão, fritam-se batatas e febras, grelham-se salsichas toscanas e há taças enormes de saladas. O barulho do enorme exaustor abafa as risadinhas do elemento mais jovem, a Joaninha, como todos lhe chamam, uma recém-licenciada que ainda só arranjou trabalho como ajudante de cozinha. O patrão e cozinheiro-mor derrete a margarina e a ele próprio com aquela companhia da idade da sua filha. Não se contém em humor, algumas indiretas e bajulação sem medida.

Joaninha ri-se, pelo menos tem trabalho.

Maria passeia os olhos pelo que a rodeia. Há hormonas aos pulos até na colega que tem na frente, sempre atenta à porta. Deve estar a ansiar a entrada da princesa da loja da frente. É hábito conversar até aquela hora em que a outra costuma vir beber café, nessa altura desliga do mundo e cola os olhos e o pensamento na porta.

Chama-se Rosa, a colega da Maria, e tem este dom de andar sempre apaixonada. Não só por mulheres, é tão grande o amor que tem para dar que não distingue sexo.

Ah, mas a pobre da Rosa não atrai muita gente de nenhum dos sexos! Tem um ar indefinido de género e os quilos a mais também não ajudam nada!

Linda é a Maria, mas sozinha. Tem-se deixado estar, com sonhos ternos de futuro, doçura no rosto e, quase sem querer, uma espécie de jeito especial de derreter só com um olhar. 

Pedro conhece aquele olhar mas é a primeira vez que o sente no seu quando pergunta se se pode sentar na mesa das colegas...

Maria estremece... Tem muito apreço pela amizade daquele colega... Alguns sonhos inconfessáveis mas também extremo respeito pelos vínculos laborais... O olhar saiu tão desprevenido como desprevenida a apanhou o acaso... Nunca o vira ali... Não o viu entrar... A atrapalhação dos dois era notória... Para todos menos para a Rosa a quem só interessava a porta.

Há embargo no ar... Em boa hora o empregado se dirige ao Pedro.

Que pede um café curto.

Mas é longo o segundo em que Maria e Pedro se tornam a olhar... 

Tantos trabalhos em conjunto, tanto conhecimento laboral que têm um do outro, tanta assertividade e delicadeza desde sempre e... o que é que se passava? Uma enorme dor de cabeça!

Maria é simplesmente a chefe dele, ele o seu subordinado mais promissor! Sempre se sentiram próximos e amigos mas...

Pedro estima aquela amizade como poucas. Mas nunca deixou de sonhar vagamente com o que lhe parecia impossível. 

Mal recebe o café aventura-se a resolver ir em frente. Mas são muitas as reticências...

E o trabalho? E o vínculo respeitoso que sempre se esforçou por manifestar? E a empresa? E os objetivos da temporada? E a próxima campanha que estão a desenvolver juntos? E os quadros superiores? E os outros colegas? E a amizade? E...? E...? E...?

Tantas incógnitas pode a vida conter e tantas vidas condicionadas por elas! O que hoje é problemático pode no futuro ser banal ou perfeitamente aceitável. Por outro lado, afigura-se correto, legal ou inócuo o que dantes não foi. Mudam-se os tempos e as incógnitas... Algumas valem a pena!...  

(imagem Pinterest)

 

 

 

 

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